Por Rúbia Mara da Silva
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INTRODUÇÃO
O exercício da docência está intrinsecamente ligado ao compromisso do professor com o desenvolvimento integral das crianças e adolescentes, reconhecendo-os como protagonistas do próprio processo de aprendizagem. O ato de ensinar ultrapassa a simples transmissão de conteúdos, exigindo que o educador estimule a curiosidade, a construção de hipóteses e o desejo constante de descobrir e compreender o mundo. No entanto, observa-se que muitas práticas pedagógicas ainda se baseiam em métodos tradicionais, nos quais o aluno assume uma postura passiva, limitado à repetição de exercícios e cópias do material didático, o que reduz sua autonomia e desmotiva sua participação. Esse modelo, centrado no professor, frequentemente gera desinteresse, afastamento e até evasão escolar, uma vez que o estudante deixa de atribuir sentido à experiência escolar.
Compreender o aluno como sujeito ativo implica repensar o papel do professor, que deve atuar não apenas como transmissor de informações, mas como mediador de saberes e facilitador do aprendizado. A reflexão sobre a própria prática docente torna-se, portanto, indispensável, pois permite identificar a importância de adotar metodologias diversificadas, dinâmicas e sensíveis às necessidades e interesses dos alunos. Por meio dessas estratégias, o professor pode promover aprendizagens mais significativas, observando as particularidades cognitivas, emocionais e sociais de cada estudante. Nesse contexto, a observação em sala de aula desponta como ferramenta essencial para reconhecer as diferentes formas de aprender, identificar dificuldades e planejar intervenções pedagógicas adequadas, especialmente no caso de alunos que necessitam de apoio especializado, como aqueles diagnosticados com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
A escolha deste tema parte da necessidade de compreender como a utilização de metodologias diferenciadas e a prática da observação contribuem para o processo de ensino e aprendizagem de estudantes com TEA no ensino regular. Buscou-se investigar de que maneira os docentes percebem a presença desses alunos em sala, quais estratégias pedagógicas utilizam para favorecer sua inclusão e como adaptam o currículo para atender às suas demandas específicas. Tais reflexões conduziram a questionamentos fundamentais: de que modo o professor enfrenta os desafios impostos pelo currículo tradicional ao incluir alunos com TEA? Que tipo de formação e conhecimentos ele possui sobre o tema? E como essas competências influenciam sua prática educativa e o engajamento dos estudantes?
Parte-se da hipótese de que muitos professores encontram dificuldades nesse processo, tanto pela falta de formação inicial voltada à inclusão quanto pela ausência de capacitação continuada que aborde, de forma prática e aprofundada, o atendimento às especificidades dos alunos com TEA. Essa limitação pode comprometer a efetividade das ações pedagógicas, dificultando a socialização e o progresso escolar desses estudantes. Assim, torna-se fundamental que o docente seja preparado para planejar e desenvolver práticas que promovam uma aprendizagem prazerosa e significativa, evitando o fracasso e o abandono escolar.
O presente estudo tem como propósito analisar as práticas inclusivas e as estratégias de ensino utilizadas na educação básica, refletindo sobre os avanços e desafios enfrentados por professores ao incluir alunos com Transtorno do Espectro Autista no ensino regular. Busca-se compreender as adaptações curriculares implementadas, a interação desses alunos com os colegas e o papel da escola na efetivação de um ambiente verdadeiramente inclusivo. Espera-se, com isso, contribuir para a ampliação do debate sobre a importância da observação pedagógica e das metodologias diversificadas no processo de ensino e aprendizagem, apontando caminhos que tornem o ensino mais dinâmico, acessível e humanizado.
A pesquisa tem caráter bibliográfico e empírico, fundamentando-se em referenciais teóricos e em observações realizadas em contextos escolares. Foram utilizados questionamentos diretos a professores do ensino fundamental e médio, com o objetivo de compreender suas percepções sobre o trabalho com alunos com TEA e as práticas pedagógicas empregadas. Tais dados foram analisados à luz da literatura educacional e das políticas públicas de inclusão, especialmente as diretrizes da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, que orientam a integração do aluno com deficiência em todos os níveis e modalidades de ensino.
A estrutura deste artigo está organizada em três partes. A primeira aborda aspectos conceituais do Transtorno do Espectro Autista, discutindo suas características, diagnóstico e implicações no ambiente escolar. A segunda seção trata das metodologias de ensino e da observação como instrumentos que auxiliam o professor a promover a inclusão e a aprendizagem dos alunos com TEA. Por fim, a terceira parte apresenta as considerações finais, nas quais se destacam as conclusões obtidas a partir da análise realizada, bem como as contribuições do estudo para a prática pedagógica e para a consolidação de uma educação inclusiva e de qualidade.
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DESENVOLVIMENTO
2.1 TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA) – DIAGNÓSTICO, SINTOMAS E ASPECTOS CONCEITUAIS
O Transtorno do Espectro Autista (TEA), comumente conhecido como Autismo, constitui um dos temas mais debatidos nas últimas décadas, especialmente nos campos da educação, saúde e neurociência. O crescente número de diagnósticos tem impulsionado pesquisas e reflexões que buscam compreender suas múltiplas manifestações e causas, embora ainda não haja consenso científico acerca de sua origem. O autismo é reconhecido como uma condição do neurodesenvolvimento que interfere na forma como o indivíduo percebe o mundo, interage socialmente e se comunica, manifestando-se de modo singular em cada pessoa.
A educação, enquanto parte estruturante da sociedade, evolui continuamente à medida que novos conhecimentos sobre o ser humano são produzidos. Nesse contexto, as transformações no modo de compreender as diferenças impulsionaram mudanças significativas nas práticas escolares. Até o final do século XX, predominava o ensino segregado, no qual crianças com deficiência frequentavam instituições especializadas, isoladas do convívio com seus pares. Com o advento de legislações e movimentos inclusivos, especialmente a partir da década de 1990, a escola passou a ser reconhecida como espaço de convivência plural, acolhendo a diversidade como princípio fundamental da aprendizagem.
A Declaração de Salamanca (1994) representou um marco nesse processo, ao defender que os sistemas educacionais devem ser planejados para atender a todos os alunos, respeitando suas especificidades e promovendo equidade de oportunidades. O documento enfatiza o dever dos governos de investir em políticas públicas e formações docentes voltadas à inclusão, consolidando a ideia de uma educação para todos, sem distinções. No Brasil, esse movimento foi fortalecido pela Resolução CNE/CEB nº 2/2001, que instituiu as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, e posteriormente pela Lei nº 12.764/2012, conhecida como Lei Berenice Piana, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Essa lei reconhece o TEA como uma deficiência para fins legais, garantindo o direito à matrícula na rede regular de ensino e ao Atendimento Educacional Especializado (AEE), quando necessário.
Conforme a Lei Berenice Piana, considera-se pessoa com Transtorno do Espectro Autista aquela que apresenta:
I – deficiência persistente e clinicamente significativa na comunicação e na interação social, caracterizada por prejuízos verbais e não verbais e dificuldade em estabelecer e manter relações adequadas ao seu nível de desenvolvimento;
II – padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades.
Esses direitos são reforçados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que assegura igualdade de condições no acesso à educação e ao atendimento especializado. O descumprimento dessas garantias configura infração legal, sujeitando a instituição escolar a sanções. Entretanto, para que a inclusão se efetive, é necessário que o poder público e a sociedade desenvolvam uma cultura de respeito, aceitação e preparo para acolher as crianças com TEA em ambientes escolares comuns.
De acordo com Silva et al. (2012), o Transtorno do Espectro Autista é “um transtorno global do desenvolvimento infantil que se manifesta antes dos três anos de idade e se prolonga por toda a vida”, comprometendo principalmente as áreas de socialização, comunicação e comportamento. Em muitos casos, a interação social é a mais afetada, conforme destacam Souza e Santos (2016), que descrevem o autista como alguém que, nos primeiros anos de vida, apresenta dificuldade em demonstrar apego, contato visual limitado e pouca iniciativa em interações espontâneas.
O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV-TR, APA, 2002) classifica o autismo como um transtorno global do desenvolvimento, caracterizado por anormalidades na comunicação e na interação social, além de padrões restritos de interesses e comportamentos. Segundo Gadia, Tuchman e Rotta (2004), o autismo pode ocorrer em qualquer grupo social, étnico ou cultural, sendo que entre 65% e 90% dos casos estão associados a algum grau de deficiência intelectual. A convivência escolar, contudo, desempenha papel essencial no estímulo às habilidades sociais, pois a interação com os pares contribui para o desenvolvimento afetivo e cognitivo, além de favorecer o aprendizado da convivência com as diferenças.
Compreender o indivíduo com TEA requer sensibilidade para perceber sua forma única de pensar, sentir e se relacionar. O aluno autista não é um sujeito incapaz, mas alguém que aprende de forma diferente e necessita de respeito e estratégias específicas que valorizem suas potencialidades. A falta de entendimento sobre suas particularidades pode gerar barreiras emocionais e sociais que comprometem o desenvolvimento. Assim, o olhar empático do professor e da comunidade escolar é fundamental para construir um ambiente acolhedor e estimulante.
Além das questões neurológicas, estudos apontam que fatores ambientais podem contribuir para o desenvolvimento do TEA, como exposição a substâncias tóxicas durante a gestação, uso indevido de medicamentos e consumo de álcool ou cigarro. Embora não existam causas únicas comprovadas, a literatura reforça a importância do acompanhamento pré-natal adequado como medida preventiva. Após o diagnóstico, o envolvimento de uma equipe multiprofissional — composta por médicos, psicólogos, terapeutas ocupacionais e educadores — é essencial para o atendimento integral à criança e à família.
O diagnóstico de TEA costuma ser um momento delicado para os pais, pois implica a desconstrução de expectativas idealizadas durante a gestação. A aceitação pode demandar tempo e apoio emocional, sendo fundamental que o profissional responsável pela comunicação do diagnóstico adote uma postura humanizada e acolhedora. A adaptação familiar a essa nova realidade pode ser desafiadora, exigindo orientação e suporte contínuo. Dessa forma, o acompanhamento precoce e interdisciplinar torna-se indispensável para garantir o bem-estar da criança e seu pleno desenvolvimento.
Por ser o TEA uma condição de diagnóstico essencialmente clínico, é imprescindível que os profissionais da educação — professores, gestores e equipe pedagógica — possuam conhecimento sobre suas características e manifestações. Tal preparo possibilita a elaboração de estratégias pedagógicas adequadas, favorecendo uma aprendizagem significativa e uma vivência escolar inclusiva, pautada na valorização das diferenças e no respeito à singularidade de cada aluno.
2.2 FORMAÇÃO DOCENTE
A educação, enquanto processo social, tem como finalidade promover a interação entre os sujeitos, possibilitando que estes se reconheçam como parte integrante da sociedade e desenvolvam sua personalidade por meio da convivência em grupos e da participação em práticas coletivas e individuais. Entre as funções essenciais da escola está a democratização do acesso ao conhecimento científico, cultural e ético, previamente sistematizado ao longo da história humana. Entretanto, a formação integral da criança não se restringe à instituição escolar, pois resulta da articulação entre a família e a escola, espaços fundamentais na constituição de valores, princípios e regras que orientam o convívio social. Nesse contexto, o papel do professor ganha centralidade, visto que sua atuação e qualificação influenciam diretamente o êxito do processo educativo. Um docente que não busca constante atualização e pesquisa sobre as especificidades de seus alunos, especialmente aqueles com Transtorno do Espectro Autista (TEA), dificilmente alcançará o propósito maior da educação: ensinar com intencionalidade, sensibilidade e significado.
Segundo Antunes (2016), a escola foi criada com o intuito de reduzir desigualdades e garantir oportunidades, mas, paradoxalmente, consolidou práticas que acentuam as diferenças, estabelecendo critérios meritocráticos e excludentes, principalmente no campo da avaliação. Essa lógica, historicamente construída, contribuiu para a exclusão de inúmeras crianças e jovens, comprometendo suas perspectivas de vida. Diante desse cenário, cabe à escola ressignificar seu papel social, adotando práticas pedagógicas mais inclusivas e humanizadas, que valorizem as potencialidades e ritmos individuais de aprendizagem. A superação dessa visão classificatória requer que o professor assuma uma postura investigativa e crítica diante do conhecimento, distinguindo o que é pedagogicamente relevante e adequando suas práticas à realidade concreta de seus alunos. Assim, o ensino deixa de ser mera transmissão e se transforma em produção coletiva de saberes, em um processo no qual o aluno é protagonista da construção do conhecimento.
Nesse sentido, as metodologias diferenciadas assumem papel fundamental na promoção da inclusão, especialmente de estudantes com TEA. Tais metodologias, ao buscar novas formas de ensinar, permitem o desenvolvimento de aprendizagens mais significativas, despertando o interesse, a curiosidade e o engajamento dos alunos. A partir de práticas flexíveis, o professor amplia o repertório de possibilidades didáticas, favorecendo a interação social e a autonomia intelectual. Essa abordagem é particularmente relevante para o aluno com autismo, que tende a apresentar maior dificuldade de comunicação e interação com os colegas. Ao diversificar estratégias pedagógicas, o docente não apenas respeita as particularidades de cada sujeito, mas também cria oportunidades para que o processo de ensino e aprendizagem se torne prazeroso, dinâmico e contextualizado.
A formação docente contínua é, portanto, um elemento imprescindível para a efetivação de práticas inclusivas. O professor não é um agente estático, mas um profissional em permanente processo de aprendizado e reconstrução de saberes. Conforme destaca Fumegalli (2012), a formação deve ser concebida como um movimento constante de aprimoramento, acompanhando as transformações sociais e tecnológicas que redefinem o papel da educação na contemporaneidade. É nesse processo de reflexão e autocrítica que o educador é capaz de rever suas práticas, identificar acertos e limitações, e adaptar suas estratégias conforme as necessidades apresentadas por seus alunos. Essa postura reflexiva e investigativa torna-se ainda mais essencial diante da diversidade presente nas salas de aula, em especial quando se trata de educandos com TEA, que exigem atenção redobrada às formas de comunicação, estímulo e mediação.
A escola inclusiva pressupõe o reconhecimento das diferenças e a valorização das potencialidades individuais. Para Corrêa (2010), a educação deve atender a todos os alunos, independentemente de suas condições de aprendizagem, reconhecendo suas singularidades e histórias de vida. Tal perspectiva rompe com o paradigma homogeneizador da educação tradicional, propondo uma escola que acolhe, respeita e potencializa as capacidades de cada sujeito. O professor, nesse cenário, deve atuar como mediador entre o conhecimento e a experiência do aluno, criando situações de aprendizagem que despertem o interesse e o prazer em aprender. No caso dos estudantes com TEA, essa mediação requer sensibilidade para compreender seus modos de expressão, suas formas de perceber o mundo e seus interesses específicos, utilizando tais elementos como ponto de partida para a construção do conhecimento.
Conforme observa Barbosa (2006), a escola, historicamente, nem sempre conseguiu transformar a frustração em aprendizado e o prazer em motivação. Por muito tempo, o ensino foi pautado em práticas punitivas e recompensatórias, em que o erro era penalizado e o acerto, premiado, sem que se promovesse reflexão ou envolvimento real do aluno no processo educativo. A superação dessa visão requer um educador criativo, dinâmico e afetivo, capaz de articular razão e emoção, cognição e sensibilidade. Ser professor, portanto, é reinventar-se continuamente, conduzindo o aluno a desenvolver autonomia intelectual, senso crítico e empatia. O docente que adota uma postura humanizada e aberta à escuta transforma a sala de aula em um espaço de investigação, diálogo e construção compartilhada de saberes.
A inclusão do aluno com TEA demanda do professor atenção especial à organização didática. Nascimento, Nascimento e Santos (2017) afirmam que as atividades devem ser planejadas com recursos visuais e concretos, adaptados às necessidades do estudante, mas mantendo os mesmos objetivos de ensino dos demais alunos. Os autores ressaltam ainda que o desenvolvimento da criança autista é potencializado por estímulos externos — físicos, verbais e gestuais — que podem ser explorados pedagogicamente no contexto escolar. Assim, a prática docente deve integrar diferentes formas de comunicação, privilegiando estratégias que favoreçam a compreensão, a interação e a autonomia do aluno. Mais do que reproduzir informações sobre o TEA, o educador precisa conhecer profundamente seus estudantes, observando comportamentos, identificando habilidades e reconhecendo dificuldades de forma empática e construtiva.
A observação sistemática, nesse contexto, emerge como ferramenta essencial do trabalho pedagógico. Observar não é apenas olhar, mas compreender o aluno em sua totalidade, interpretando suas atitudes, reações e formas de expressão. Por meio dessa prática, o professor obtém subsídios para planejar intervenções mais eficazes, personalizadas e coerentes com as necessidades do educando. Essa postura reflexiva permite identificar potencialidades e promover o desenvolvimento integral, respeitando o ritmo e a singularidade de cada aluno. A observação contínua, associada a metodologias ativas e inclusivas, possibilita que o professor compreenda o processo de aprendizagem de forma ampla, contribuindo para a formação de um sujeito autônomo, crítico e socialmente integrado.
Dessa forma, a ação pedagógica voltada aos alunos com TEA deve estar alicerçada em três pilares: formação docente contínua, metodologias diferenciadas e observação atenta. A integração desses elementos promove não apenas a aprendizagem, mas também a valorização da diversidade e o fortalecimento da empatia como princípio educativo. O professor, ao compreender a complexidade do processo de inclusão, torna-se mediador de transformações, contribuindo para a construção de uma escola verdadeiramente democrática, capaz de acolher e educar a todos com equidade, respeito e sensibilidade.
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CONCLUSÃO
A constituição deste estudo resultou de uma pesquisa bibliográfica voltada à compreensão do processo de inclusão de alunos com Transtorno do Espectro Autista (TEA) nas salas de ensino regular e à análise das formas como os professores realizam a adaptação curricular em suas práticas pedagógicas. Para tal, foram consultados obras acadêmicas, artigos científicos, revistas especializadas e demais materiais relacionados à temática, além da realização de entrevistas com docentes atuantes na educação básica. O objetivo foi delinear um panorama sobre o autismo, considerando os fundamentos legais e normativos que orientam a inclusão educacional, bem como discutir as práticas pedagógicas que podem contribuir ou dificultar o processo de ensino-aprendizagem desses educandos. A escolha do tema emergiu a partir da vivência em uma instituição escolar que, embora apresente um ambiente acolhedor para estudantes com TEA, enfrenta desafios relacionados ao elevado número de alunos por turma e à carência de formações específicas para os professores regentes no atendimento às necessidades educacionais especiais. Tal realidade evidencia a contradição entre o discurso institucional de inclusão e a falta de preparo efetivo dos profissionais, revelando uma exclusão estrutural que perpassa dimensões educacionais, profissionais e governamentais. Faltam capacitações continuadas, turmas reduzidas e políticas públicas que favoreçam um acompanhamento individualizado e humanizado, elementos fundamentais para o desenvolvimento pleno desses alunos.
Embora as instituições de ensino busquem cumprir as determinações legais, como as previstas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB nº 9.394/1996), ampliando o número de matrículas de alunos com deficiência, essa inclusão muitas vezes se restringe à presença física em sala de aula, sem garantir o real aprendizado e o desenvolvimento das potencialidades individuais. A efetiva inclusão pressupõe o engajamento pedagógico e a formação docente adequada para lidar com as especificidades dos alunos com TEA. Contudo, a ausência de treinamentos, capacitações e políticas públicas consistentes reflete-se em práticas pedagógicas pouco efetivas, em metodologias limitadas e em uma sobrecarga profissional que impede o avanço do processo inclusivo. Mesmo diante de tais desafios, observa-se que a convivência entre alunos com e sem deficiência pode promover transformações significativas nas relações interpessoais e na percepção social sobre a diversidade, estimulando comportamentos de empatia e colaboração mútua. Assim, a inclusão torna-se um processo formativo não apenas para o aluno com TEA, mas para toda a comunidade escolar, exigindo intervenções contínuas e reflexivas que visem o desenvolvimento da autonomia e da aprendizagem significativa. Este estudo, portanto, contribui para o aprimoramento da prática docente inclusiva, reforçando a importância da formação permanente e da adoção de práticas pedagógicas diversificadas, capazes de atender às especificidades e potencialidades de cada educando.
Em uma sociedade marcada pelo dinamismo, pela competitividade e pela lógica capitalista, o papel do professor é constantemente desafiado e ressignificado. A docência requer constante atualização, comprometimento com o processo de ensino e aprendizagem e disposição para compreender as múltiplas dimensões que envolvem o desenvolvimento humano — afetivas, cognitivas, motoras, sociais, políticas e econômicas. Quando se trata de alunos com TEA, torna-se imprescindível compreender que a inclusão ultrapassa a simples permanência em sala de aula, exigindo práticas que promovam interações significativas e o engajamento ativo do estudante no processo educativo. Ter o aluno presente não é sinônimo de inclusão, mas de frequência; incluir é permitir que ele participe, interaja, compreenda e construa seu próprio conhecimento. O professor, portanto, deve atuar como mediador, favorecendo o protagonismo do aluno e promovendo situações de aprendizagem que despertem seu interesse e valorizem suas formas particulares de expressão. A efetividade desse processo depende do planejamento intencional e da dedicação docente, que devem priorizar metodologias dinâmicas, observação constante e adaptação curricular contínua, de modo a favorecer o desenvolvimento integral do aluno com TEA.
A elaboração deste trabalho possibilitou uma análise crítica e reflexiva acerca da inclusão escolar e da importância das metodologias diferenciadas e da observação pedagógica no acompanhamento do aluno com TEA. Constatou-se que, embora as dificuldades estruturais e formativas ainda sejam expressivas, é possível desenvolver práticas significativas por meio da escuta sensível, do planejamento colaborativo e da interação entre professores, gestores e famílias. O processo inclusivo, portanto, deve ser compreendido como um compromisso ético e social, que busca romper barreiras atitudinais e promover uma educação libertadora, pautada na valorização das diferenças e na construção de uma escola verdadeiramente democrática. Assim, a inclusão não se resume a uma obrigação legal, mas constitui um direito humano fundamental e um princípio norteador para a formação de uma sociedade mais justa, empática e equitativa.
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